sexta-feira, novembro 10, 2006

Reportagem especial - Tradição na várzea: Parte I

[ Reportagem especial para impresso. Eu e minha dupla, Bru, tiramos 10, na primeira versão da matéria, com pouquissimos erros corrigidos e nenhum corte, e o Rodolfo disse que estava muito boa. O tema do nosso grupo foi Futebol de várzea. E o da minha dupla A Tradição da várzea, atravessando gerações (ou não ?!?!) E como ficamos muito orgulhosa de nós, resolvi compartilhar com vocês, nossa primeira reportagem especial. Estreando com louvor! Porém, para não ficar cansataiva, como ela está dividida em três intertítulos, os postarei um por vez.]
Passando a bola


Por Priscila Della Bella e Bruna Tonzano

Mais do que amor, várzea é tradição. Mais do que tradição, futebol de várzea é projeto de vida de muita gente. Ou pelo menos foi um dia. Para essas pessoas, várzea hoje é sinônimo de saudade. As grades que cercam o chão de terra, cheia de torcedores ao seu redor, gritos de olés e gols, nervosismo e diversão. Todo esse cenário construía os campos varzeanos no passado e está longe de voltar a ser realidade no futuro. Muitos homens que tiveram o futebol marcado pela várzea ainda tentam resgatar um pouco da felicidade jogando com prazer e seriedade. O que eles menos querem é o fim da várzea. Por isso, levam os filhos, incentivam, torcem e vibram para que o futebol dos campos de lama nunca perca sua essência.

Por esses motivos que o paulistano supervisor de logística, Cláudio Soares, 43 anos, abandona nos finais de semana o terno, a gravata, o sapato social e coloca uma chuteira barrenta para bater uma bolinha. Ele é um dos saudosistas da década de 70, quando as pessoas organizavam torcidas e iam para os campos assistir aos jogos. “Hoje os campos estão vazios. Com o crescimento populacional, diminuiu o número de campos de várzea das cidades, consequentemente menos adeptos ao futebol varzeano”, lamenta Cláudio. Nessa época, era comum os campos de terra revelarem futuros talentos profissionais, como foi o caso de Pedro Rodrigues (Corinthians), Lima (São Paulo) e Pituca (Santos). “Iniciei na várzea com apenas nove anos de idade. Na década de 70 os jovens utilizavam a várzea para ser jogador de futebol profissional, tinha muitos olheiros nos campos”, relembra Cláudio com a expressão facial de saudade daquele tempo.

Já nos dias de hoje, a várzea serve apenas como treino para os garotos que sonham em se profissionalizar um dia. “Foram grandes revelações na várzea para o futebol brasileiro. Hoje a possibilidade é remota. O campo de várzea serve apenas para iniciação de alguns jovens. Depois o pai do garoto o leva para uma escolinha ou clube”, explica Cláudio que incentivou o filho a procurar outros meios para se profissionalizar no esporte.

Aos seis anos, o estudante Diego Glauco Soares já “batia uma bola” com o pai. Aos 14 anos, resolveu levar a brincadeira a sério. “Comecei em 2002 por incentivo do meu pai, para adquirir experiência jogando com adultos. Sou federado e só jogo na várzea quando não há coincidências de jogos dos campeonatos que disputo”, conta Diego, hoje com 18 anos.

Qual garoto apaixonado por futebol não sonha em ser o Ronaldinho Gaúcho ou o Kaká? Sonhar não arranca pedaço, eles tentam chegar lá fazendo testes para clubes e, muitas vezes, não conseguem passar nem na primeira peneira. Com Diego não é diferente. “Realmente é um sonho ser jogador profissional de futebol. Agora quanto ao sucesso, pretendo subir até o primeiro degrau. Uma boa carreira, será a conseqüência de meu trabalho”, revela o garoto sonhador.

Para Cláudio, a várzea não acabou. “Ela apenas está vazia, falta criatividade para organizar campeonatos e torneios. O brasileiro tem um amor contagiante pelo futebol. Por isso, posso afirmar com certeza que jamais deixaremos o futebol varzeano acabar. O importante é bater uma bolinha e jogar conversa fora”. Já Diego pensa de outra forma. “Na várzea estou adquirindo recursos, mas meu objetivo principal é jogar futebol profissional”.

A experiência pode ser adquirida nos campos, mas a vontade de aprender e o amor ao esporte “vêm de berço”. “Meu pai sempre foi um incentivador, foi ele quem me ensinou os primeiros chutes a gol. O futebol está em nosso sangue", relata Diego. Tendo seu pai como espelho, o garoto segue os ensinamentos e arrisca dividir a bola com o pai de vez quando. “É muito gostoso jogar com meu pai. Ele não gosta muito de perder. No entanto, ele me ensinou que a derrota faz parte do esporte e de nossa vida, mas são as derrotas que faz com que conquistemos as grandes vitórias. As jogadas de meu pai são inteligentes. Mostram que ele ainda é um grande atleta, mesmo com o dobro da minha idade”, conclui Diego.

[continua...]

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